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Artigo: Afinal, o que é Champagne?

Afinal, o que é Champagne?*

Por Kelly LissandraBruch

Há alguns anos você saberia dizer qual é a diferencia entre um champagne e um espumante? Certamente o sucesso do espumante brasileiro fez com que nós descobríssemos que champagne é um tipo de espumante, além de outros inúmeros que o Brasil tem produzido com sucesso, tais como o moscatel – que utiliza o processo asti, ou ainda o espumante feito a partir da uva prosecco, e os espumantes feitos pelo método charmat ou pelo método champenoise. Mas, o que esses nomes têm em comum? São eles métodos de elaborar um espumante ou por trás destes nomes haveria algo a mais? Se analisarmos o uso do termo champagne cronologicamente, veremos que no Brasil, desde 1896, utilizamos este termo como um sinônimo de vinho espumante. Inclusive em maio de 1921 a Companhia Antarctica Paulista lançou o Guaraná Champagne Antártica-, em uma alusão clara deste refrigerante dourado com o espumante francês. Nas legislações de 1969, 1973 e na atual Lei do Vinho n. 7678 de 1988, continuamos a definir o champagne ou champanha como um tipo de vinho: o vinho espumante. Aliás, em 1975 o ComitéInterprofessionneldesVins de Champagne (CIVC) – Associação dos produtores de vinho de Champagne – levou à justiça algumas empresas brasileiras que há mais de 30 anos (na época) utilizavam este termo para denominar os seus espumantes. Estas empresas – Armando Peterlongo e Cia Ltda, ChampagneGeogers Aubert S.A., Mosele S.A., Estabelecimentos Vinícolas Indústria e Comércio e Dreher S.A. Vinhos e Champagnhas – ganharam a discussão no Tribunal Federal de Recursos (RE 78835), garantindo o direito de uso desta denominação para os seus espumantes. Não que esse uso fosse ou – ainda hoje – seja proibido: legalmente qualquer empresa pode chamar seu espumante de champagne, pois está previsto na lei!Resta saber se na atual conjuntura isso nos convém. Mas, você deve estar pensando, depois de tanto tempo, por que remoer estas histórias hoje? Porque em 04 de agosto de 2011 a CIVC protocolou no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) do Brasil o pedido do reconhecimento de Champagne como uma Denominação de Origem para vinhos espumantes. O processo IG 201102 foi publicado para receber manifestações de terceiros ou mesmo oposição ao seu reconhecimento em 16 de novembro de 2011, na Revista da Propriedade Industrial n. 2132, p. 267. Resta agora saber o que pensa o Brasil. Seria champagne uma denominação de origem ou um tipo de vinho (o vinho espumante)? Há dez ou vinte anos, diria eu que esse reconhecimento seria impossível, pois para o brasileiro este nome se referia a um tipo de produto, e não a uma denominação de origem de uso exclusivo dos habitantes da famosa região francesa. Mas, e hoje? O que prevaleceria? Será que alguém irá se opor? Há argumentos para todos os gostos. Por um lado, o acordo TRIPS permite que, mesmo com o reconhecimento da exclusividade de uso deste signo, aqueles que há mais de 10 anos antes de 1994 (ou seja, antes de 1984), que usavam o termo de boa fé, podem continuar utilizando-o. Mas, por outro lado, em 1891 o Brasil firmou o Acordo de Madri, relativo à repressão das falsas indicações de proveniência sobre as mercadorias, o qual, dentre uma série de coisas, este prevê (pois continua valendo) que as indicações de proveniência para vinho não podem ser consideradas genéricas– em assim sendo, desde esta data o Brasil teria reconhecido tacitamente Champagne. Mas, em países como a Inglaterra e a Suíça se entendeu que champagne não era um vinho, mas um produto composto – derivado do vinho. E continuaram a produtirchampagneanglais e champagnesuisse. Vale ressaltar ainda que quando utilizamos pela primeira vez no Brasil a palavra champagne – em 1896, esta ainda não estava protegida na França, pois Champagne somente foi reconhecida por um Decreto como uma Appellation d’Origin em 17 de dezembro de 1908. E daí? Bem, se até 16 de janeiro de 2012 ninguém se manifestar contrário a este reconhecimento, teremos, pela primeira vez, a possibilidade de uma proibição legal do uso de Champagne para vinhos espumantes provenientes de qualquer outro lugar que não seja esta região específica da França (o que inclui os espumantes brasileiros).Resta saber se alguém irá se manifestar perante o INPI, ou se este irá entender que champagne é (ou não) um tipo de espumante que pode ser produzido no Brasil. Vale a pena a peleja?

(*Artigo originalmente publicado em A Vindima, Ed. 36, de 20/01/2012)

Kelly Lissandra Bruch - Pós-Doutora em Agronegócios pelo CEPAN/UFRGS. Doutora em Direito pela Université Rennes I, France em co-tutela com a UFRGS. Mestre em Agronegócios pelo CEPAN/UFRGS. Especialista em Direito e Negócios Internacionais pela UFSC. Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Ponta Grossa. Professora do Departamento de Direito Econômico e do Trabalho, da Faculdade de Direito da UFRGS. Professora do Programa de Mestrado de Biotecnologia e Gestão Vitivinícola da Universidade de Caxias do Sul. Professora de Direito da CESUCA. Consultora Jurídica do Instituto Brasileiro do Vinho.Membro da Comissão Especial de Propriedade Intelectual da OAB/RS, Expert indicada pelo Governo Brasileiro junto à Organização Internacional da Uva e do Vinho OIV. Associada da Associação Internacional de Juristas do Vinho.
Kelly Lissandra Bruch – Pós-Doutora em Agronegócios pelo CEPAN/UFRGS. Doutora em Direito pela Université Rennes I, em co-tutela com a UFRGS. Mestre em Agronegócios pelo CEPAN/UFRGS. Professora do Departamento de Direito Econômico e do Trabalho, da Faculdade de Direito da UFRGS. Professora do Programa de Mestrado de Biotecnologia e Gestão Vitivinícola da Universidade de Caxias do Sul. Professora de Direito da CESUCA. Consultora Jurídica do Instituto Brasileiro do Vinho.Membro da Comissão Especial de Propriedade Intelectual da OAB/RS, Expert indicada pelo Governo Brasileiro junto à Organização Internacional da Uva e do Vinho OIV. Associada da Associação Internacional de Juristas do Vinho.

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