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A pequena e média propriedade agrária no Brasil

por Darcy Walmor Zibetti – Presidente da UBAU.

 

Antecedentes

1- A grande Propriedade Agrária foi introduzida no Brasil pela Coroa Portuguesa através do Sistema Sesmarial que perdurou até a sua suspensão com a Resolução nº 76 de D. Pedro I, em 17/7/1822.

 2- A pequena propriedade agrária foi introduzida pela imigração durante o período do Reino e do Império, como ocorreu com alemães e suíços em Nova Friburgo- RJ em 1819/1820 e de alemães em São Leopoldo/RS em 1824.

3- Lei nº 601/1850 estabeleceu que o limite da dimensão da área a ser desmembrada, seria de 500 braças em quadro. Tendo que uma braça de 2,20 metros, resulta em 121 ha, a teor do seu Artigo 14.

4- O Estatuto da Terra- Lei nº 4.504/1964, previu o instituto do Módulo Rural, definido como sendo a área da agricultura familiar e, o Módulo serviria para classificação do imóvel rural. Ou seja: 1-minifúndio:  imóvel de área inferior ao Módulo Rural; 2- Empresa Rural: mesmo sendo de pessoa física, seria o imóvel inexpropriável ; 3- Latifúndio por Exploração: assim considerado o imóvel que não cumpre a função social, sendo passível de desapropriação;  4- Latifúndio por dimensão: seria o imóvel com área superior a 600 vezes o Módulo para exploração indefinida.

A Constituição da República deu nova dimensão à questão.

Previu no Artigo 185, inciso I, da Constituição Federal de 1988 que a pequena e média propriedade agrária, a serem definidas em lei como bens inexpropriáveis, desde que seu titular não possua outro imóvel. Por sua vez, a lei que regulamente tal dispositivo constitucional é a Lei nº 8.629/1993. Assim, estabelece no artigo 4, inciso II: A pequena propriedade agrária é o imóvel agrário de área compreendida entre 1 (um) e 4 (quatro) módulos fiscais. E, no inciso III: a média propriedade Agrária como sendo o imóvel agrário de área superior a 4 (quatro) até 15 (quinze) módulos fiscais.

Todavia, a Lei nº 6.746/1979 alterou o Estatuto da Terra e modificou a concepção de módulo rural como a agricultura familiar, para módulo fiscal estabelecido pelo Poder Público.

O módulo fiscal é fixo para cada município do País e pode variar sua dimensão com a região e o tipo de exploração predominante. O módulo fiscal pode ser de 5 (cinco) a 110 ha , ou seja multiplicando-se por 4, ter-se-ia que a pequena propriedade pode alcançar a 440 ha.

O módulo fiscal é utilizado pelo novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012) como parâmetro para sua aplicação em diversos contextos como na definição de faixas mínimas para a recomposição das áreas de Preservação Permanente e da manutenção ou recomposição de Reserva Legal, entre outros.

O imóvel com área inferior ao módulo fiscal é considerado minifúndio.

O imóvel com área superior a 15 módulos fiscais é considerado grande  propriedade, podendo ser “propriedade produtiva”, nos termos do Artigo 185 da Constituição de 1988 e nos termos do Artigo 6º da Lei nº 8.629/1993, ou ser latifúndio passível de expropriação, por não cumprir os requisitos da função social da propriedade, previstos no Artigo 186 da Carta Política do País.

 

Agricultura Familiar

 

A lei que regula a agricultura familiar é  a Lei nº 11.326/2006.

Ela considera o agricultor familiar ou empreendedor familiar aquele que pratica atividade no meio rural, atendendo, simultaneamente, os seguintes requisitos; 1- Não detenha a qualquer título, área maior que 4 (quatro) módulos fiscais; 2- Utilize, predominantemente, mão de obra da família nas atividades econômicas do estabelecimento ou empreendimento; 3- Tenha percentual mínimo de renda familiar originada de atividade econômica do estabelecimento ou empreendimento na forma definida pelo Poder Público, através do PRONAF; 4- Dirija o estabelecimento ou empreendimento com a família..

O Decreto nº  9.064/2017, que regulamente a Lei da Agricultura Familiar, define o módulo fiscal como “unidade de medida agrária” para classificação fundiária, expressa em  hectares.

 

PRONAF

O PRONAF- Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar foi criado pelo Decreto nº 1.946/1996, e tem como objetivo promover o desenvolvimento sustentável da “Agricultura Familiar”.

Abrange facilidade de crédito e outros benefícios.

A Portaria nº. 523/2018 disciplina a emissão de Declaração de Aptidão ao PRONAF (DAP).

A Constituição de 88 prevê no Artigo 23 a competência comum da União, Estados, Municípios e Distrito Federal para “fomentar a produção agropecuária e a organização do abastecimento alimentar”.

Agroindústria familiar

Os Estados, obedecendo as normas federais de sanidade vegetal e animal podem expedir Leis sobre  agroindústrias familiares, agregando valor à atividade agrária.

Finalidade da pequena e média propriedade agrária

A finalidade da pequena e  média propriedade agrária é dar cumprimento à Lei nº 11.346/2006 que criou o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional  (SISAN) para  assegurar o direito humano à alimentação. Ademais, a Emenda Constitucional nº 64/2010, considerou a alimentação um direito social ao lado da saúde, educação , etc, no Artigo 6 da Constituição Cidadã de 1988.

Como existe um grande número de  pequenas e médias propriedades agrárias no Brasil, na América Latina e mundo afora, a FAO/ONU, lançou a  “Década da Agricultura Familiar”, o período de 2019 a 2028.

As pequenas e médias propriedades agrárias mantêm a biodiversidade existente nos diversos biomas e ecossistemas para efeitos gastronômicos e genéticos.

Por sua vez, o Brasil, através do Decreto nº 10.375/2020, instituiu o programa do Bioinsumos e o Conselho Estratégico de Bioinsumos.

O Programa visa, também, atrair recursos para financiamentos de biofábricas e utilização de recursos biológicos na agropecuária brasileira, inclusive, inoculantes, controles biológicos, substituindo os químicos sintéticos.

O rumo a seguir é a transformação da Política Agrícola em Política da Alimentação Sadia para a Humanidade.

Nota 1

Integra o presente estudo  a Carta de Caxias do Sul, aprovada pelo Plenário dos participantes do V Simpósio Agrarista , realizado em 17 de novembro de 2017, em Caxias do Sul, promovido pela UBAU, em parceria com a Faculdade de Agronomia da Universidade de Caxias do Sul.

Tal documento expressa a defesa da pequena e média propriedade agrária, pois esta constituem 80% dos imóveis agrários brasileiros e, reivindica,  que o sistema do agronegócio possa cada vez mais ser inserido em seu contexto.

Carta agrarista de Caxias do Sul em defesa da pequena e média propriedade agrária

 

Realizado em forma de parceria entre a União Brasileira dos Agraristas Universitários – UBAU e o Curso de Agronomia da Universidade de Caxias do Sul – UCS, os participantes do “V Simpósio Agrarista – A pequena e a média propriedade agrária do amanhã”, realizado no dia 17 de novembro de 2017, no Bloco H da Universidade de Caxias do Sul, aprovam ao final do evento o seguinte documento:

1. Segundo dados oficiais (IBGE/IPEA), aproximadamente 80% dos imóveis rurais do Rio Grande do Sul e do país possuem dimensão de pequena (entre 1 e 4 módulos fiscais) e média (área superior a 4 e até 15 módulos fiscais) propriedade.

2. É de conhecimento público que no atual contexto do agronegócio o uso de tecnologia possibilita o aumento de renda (ALVES, Eliseu; DA SILVA E SOUZA, Geraldo; ROCHA, Daniela de Paula. Lucratividade da Agricultura.In: Revista de Política Agrícola, Ano XXI – No 45 2 – Abr./Maio/Jun. 2012), independentemente do tamanho da propriedade rural, em que pese o uso de tecnologias seja observado geralmente nas grandes propriedades. Tal uso tem impacto direto na produtividade, na agregação de valor e na maior renda ao produtor rural.

3. E a pequena e a média propriedade agrária não deve aderir a esse novo paradigma de exploração agrícola e florestal em atenção às demandas dos mercados consumidores locais, regionais, nacionais e internacionais?

4. Quem assegura considerável parte dos produtos agrícolas integrantes da cesta básica não é a pequena e a média propriedade agrária?

5. Impõe-se, portanto, de um lado, uma reação do próprio pequeno e médio produtor rural, mediante sua profissionalização, assumindo o espírito do empreendedorismo e assegurar a garantia da sucessão familiar com melhor gestão e condições de melhor produtividade e produção com sustentabilidade ambiental. Nesse sentido, também devem ser incentivados programas que remunerem os pequenos e médios produtores quando observadas boas práticas agrícolas e pela proteção dos recursos naturais, inclusive concretizando mecanismos de pagamentos por serviços ambientais e ecossistêmicos.

6. De outro lado, observando a competência comum prevista no art. 23, inc. VIII, da Constituição Federal de 1988, cabe ao Governo Municipal, Estadual e Federal apoiar e estimular a pequena e a média propriedade, propiciando assistência técnica, fomentando a agropecuária e o abastecimento alimentar de qualidade, inclusive garantindo um seguro da atividade agrária que proteja os pequenos e médios produtores em face das mudanças climáticas.

7. O pequeno e o médio produtor rural deve ter a maior renda possível com o fruto do seu trabalho, tendo em vista que o produto agropecuário deve ser de qualidade e atender à questão da saúde e da segurança alimentar, devendo estar atento, portanto, as exigências do mercado consumidor.

8. A riqueza agrária brasileira é de valor inestimável em sua biodiversidade biológica. A diversidade de seus solos agrícolas é uma alternativa viável de haver cadeias produtivas com diversificação de culturas como medida de evitar o êxodo rural, inclusive associando à atividade rural o agroturismo, a exemplo do que já ocorre com as agroindústrias da cadeia do vinho.

9. Na Expo-Milão sobre a alimentação de 2015, a ONU reclamou do Brasil maior produção e produtividade em face dos objetivos mundiais de combate à fome e à subnutrição, sendo que o cumprimento de tais metas também passam pela contribuição dos nossos pequenos e médios produtores rurais e surge como uma oportunidade de participar do mercado internacional dos produtos agrícolas.

10. Como forma de desenvolver e fortalecer os pequenos e médios produtores deve-se incentivar, por meio das políticas públicas, a elaboração de programas agrícolas locais e regionais que favoreçam a implantação de projetos hortifrutigranjeiros, por meio de incentivos fiscais, fomento agrícola e envolvimento com instituições de ensino e extensão rural, com a finalidade de abastecer os respectivos mercados consumidores com produtos saudáveis e com melhor preço para o produtor e o consumidor. Os projetos devem, de preferência, ser elaborados e implantados próximos a cursos d’água. Além disso, também devem ser incentivados programas para a implantação de projetos de irrigação para as respectivas culturas, inclusive favorecendo a utilização da água de reuso e a captação da água da chuva para o uso agrícola. Por fim, devem ser aprimorados e incentivados os programas de aquisição de alimentos pelo poder público municipal, estadual e federal.

Portanto, fortalecer a pequena e a média propriedade agrária com apoio particular e público é um imperativo impostergável da Nação Brasileira.

Comissão relatora:

Prof. Dr. Darcy Wlamor Zibetti – Presidente da UBAU

Prof. Dr. Sérgio Augustin – UCS

Prof. Ms. Albenir Querubini – Vice-Presidente da UBAU.

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